domingo, 26 de agosto de 2012

Quem voce é

“Você não é o seu emprego. Você não é quanto dinheiro possui no banco. Você não é o carro que dirige. Você não é o conteúdo da sua carteira.” Essas frases são do filme cult Clube da Luta, onde a destruição do papel social desempenhado pelo protagonista é a base de sua completa libertação. É um filme niilista, sem dúvida, e esse é um de seus maiores atrativos. Viver de acordo com seus desejos mais profundos e não conforme as regras da sociedade, quem nunca quis? A destruição das crenças e valores associados às estruturas tradicionais traz em seu bojo a sedutora idéia de liberdade, de não ser mais definido pela família, emprego, religião ou papel dentro da sociedade, mas ser verdadeiramente quem se é. E quem é você? Às vezes acho que passamos a vida procurando resposta para essa pergunta. Até certo ponto o conteúdo da carteira, a escolha do carro, do emprego ou família define quem somos nós. São reflexos – passíveis de interpretações únicas, pois que individuais – de um eu mais privado, mais profundo e normalmente tão pouco visitado que os tais reflexos acabam sendo tomados como o todo. É a tal da persona a que se referia Jung. Mas nos momentos de doença ou de solidão é muito raro que essas manifestações de adaptação ao mundo exterior sejam suficientes para apaziguar-nos e sentimos falta de nós mesmos. Sendo multifacetados, buscamos aqueles pedacinhos coloridos do nosso caleidoscópio que há muito tempo não vêm à luz, soterrados pelas exigências do cotidiano. Acontece que se você tirar um fragmento que seja de um caleidoscópio, ele muda, e seus reflexos não são mais os mesmos. É para não nos esquecermos de nenhum pedacinho das facetas que nos compõem que a artista plástica Keri Smith (www.kerismith.com) insiste que voltemos a brincar. Infelizmente seus livros ainda não foram publicados em português, mas, para quem lê razoavelmente em inglês, vale a pena comprá-los. Através de pouca teoria e muitas atividades práticas essa canadense inspira seus leitores a diminuir o ritmo e a tentar recriar atividades que os absorviam e geravam prazer quando crianças. Passei uma tarde me ensaiando para brincar, pensando e não agindo, tal a montanha de pó que cobre esses fragmentos de mim mesma. Finalmente me encorajei e fiquei atônita ao reavaliar meus interesses. Quisera ter feito isso mais vezes na vida e fundamentalmente ao final da adolescência, temporada de testes vocacionais. Pense em suas brincadeiras de infância. Do que é que você gostava de brincar? De mexer na terra? De explorar a natureza? Você desenhava ou pintava? Quando é que você se sentia mais livre e feliz? Lendo sozinho? Correndo num parque? Competindo de bicicleta com outras crianças? Sente-se no chão. Sirva chá para algumas bonecas. Organize uma partida de futebol de botões (improvise com botões de casaco). Não se importe em se sujar. Silencie seu crítico interior e permita que a atividade o envolva. Segundo a autora, brincar é o principal elemento na descoberta de quem você é. Ao fazê-lo e ao observar a si no ato de brincar, seus mais profundos desejos lhe são sutilmente revelados. E com eles possivelmente parte da resposta à pergunta, quem sou eu, mesmo?