quarta-feira, 7 de março de 2012

Bias

A pedidos, volto a refletir sobre os jovens e o exercício da sexualidade, dessa vez pensando mais sobre os meninos. Há duas semanas elenquei algumas ideias para conversarmos com nossas filhas, primas, sobrinhas e mesmo amigas na esperança de que nunca venhamos a ser vítimas de abusos sexuais no contexto da balada, onde rola muita bebida, muita droga e muita ansiedade de provar e de se provar.

Sobre a ansiedade na balada, de provar, de experimentar coisas novas, de transcender os limites da regrada vida diurna, de aventurar-se, bem, isso faz parte do esperado pela maioria dos jovens que saem à noite. Se o objetivo fosse ficar confortável, aninhado com um computador ou livro no colo ou em frente a TV, eles ficariam em casa. Mas isso não significa que o baladeiro vá se atirar do alto de um despenhadeiro, metafórica ou literalmente, a não ser nos casos em que a capacidade de preservação de si mesmo esteja fraquejando.

Um dos fatores que complica a equação da experimentação versus autopreservação é a ansiedade de se provar. E nisso, seja por questões culturais, seja pela testosterona correndo nas veias (ou um mix dos dois) os meninos ainda são campeões, embora as meninas pareçam estar cada vez mais ansiosas de se provarem sexualmente desejáveis e ativas. Então, possivelmente a coisa mais importante que eu teria a dizer para um garoto sexualmente ativo e emocionalmente minimamente saudável – ou seja, que não tenha sido agredido no ambiente familiar a ponto de nutrir ódio pelas mulheres – que vai para a balada é: desista de se comparar.

Se a intelectual norte-americana Camille Paglia chegasse a ler esse conselho ela com certeza diria que estou pedindo demais e que se essa ideia fosse levada a sério a roda ainda não teria sido inventada. Compreendo. A competição é fundamental para a ampla maioria dos meninos e inclusive forja laços de amizade, além de ser uma força que faz o mundo girar. No entanto, a roda já foi inventada e o índice de mortalidade dos jovens brasileiros do sexo masculino por causas externas é quatro vezes maior do que o feminino, segundo dados do IBGE, e esse número só tem crescido. Por isso é fundamental educarmos jovens que sejam suficientemente seguros de si a ponto de evitar ciladas onde precisem se machucar e agredir a outros com o objetivo de se provar para os demais do seu grupo.

Todos os excessos, de bebida, de velocidade, de uso de drogas, de sexo sem camisinha e até mesmo sem consentimento, em sua maioria são, salvo casos de psicopatia, resultado de insegurança. Instantâneos de um menino tentando se provar homem, nem que para isso ele renuncie a hombridade e decaia ao nível da selvageria. Os meninos anseiam por atenção. Imaginem, então, a volubilidade de quem sai ao mundo apenas com a meta de vencer, sem parâmetros que não os externos.

Por serem do sexo masculino, e por possuirmos uma visão romantizada das capacidades inatas dos homens, muitas vezes esperamos que os meninos compreendam a vida sozinhos e pouco conversamos com eles sobre quais são as premissas básicas do respeito por si e pelos outros. Tampouco abundam diálogos sobre sexualidade para além do discurso sobre o uso da camisinha como, por exemplo, perceber se uma relação é saudável ou não. Ou sobre o direito de não se sentir constrangido a ter uma relação sexual apenas por que alguém está dando mole ou para se provar aos demais. Há um perigoso bias quando se trata de educar os meninos sobre comportamentos que a família julga adequados e sobre o que se espera dele como jovem sexualmente ativo.

Raramente explicitamos aos nossos filhos o que compreendemos como o comportamento de um homem honrado na sua vida privada, apenas no campo do trabalho. Depois nos assustamos ao descobrirmos que um profissional bem sucedido e no qual confiamos é um desequilibrado no ambiente familiar. Será que acreditamos que apenas às meninas a construção desses parâmetros se faz necessária?